A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou sete critérios objetivos para a análise de situações de lesão ao meio ambiente que possam justificar a condenação por danos morais coletivos. Os parâmetros são os seguintes:
1) Os danos morais coletivos não advêm do simples descumprimento da legislação ambiental, exigindo constatação de injusta conduta ofensiva à natureza.
2) Os danos decorrem da prática de ações e omissões lesivas, devendo ser aferidos de maneira objetiva e in re ipsa, não estando atrelados a análises subjetivas de dor, sofrimento ou abalo psíquico da coletividade ou de um grupo social.
3) Constada a existência de degradação ambiental, mediante alteração adversa das características ecológicas, presume-se a lesão intolerável ao meio ambiente e a ocorrência de danos morais coletivos, cabendo ao infrator o ônus de informar sua constatação com base em critérios extraídos da legislação ambiental.
4) A possibilidade de recomposição material do meio ambiente degradado, de maneira natural ou por intervenção antrópica, não afasta a existência de danos extrapatrimoniais causados à coletividade.
5) A avaliação de lesão imaterial ao meio ambiente deve tomar por parâmetro exame conjuntural e o aspecto cumulativo de ações praticadas por agentes distintos, impondo-se a todos os corresponsáveis pela macrolesão ambiental o dever de reparar os prejuízos morais causados, na medida de suas respectivas culpabilidades.
6) Reconhecido o dever de indenizar os danos morais coletivos em matéria ambiental (an debeatur), a gradação do montante reparatório (quantum debeatur) deve ser efetuada à vista das peculiaridades de cada caso e tendo por parâmetro a contribuição causal do infrator e sua respectiva situação socioeconômica; a extensão e a perenidade do dano; a gravidade da culpa; e o proveito obtido com o ilícito.
7) Nos biomas arrolados como patrimônio nacional pelo artigo 225, parágrafo 4º, da Constituição Federal, o dever coletivo de proteção da biota detém contornos jurídicos mais robustos, havendo dano imaterial difuso sempre que evidenciada a prática de ações ou omissões que os descaracterizem ou afetem sua integridade ecológica ou territorial, independentemente da extensão da área afetada.
Com base nesses critérios, no caso concreto analisado, o colegiado restabeleceu condenação por danos morais coletivos em caso de supressão de vegetação nativa na Amazônia Legal sem autorização dos órgãos competentes e em violação à legislação ambiental.
Apesar do parcial provimento do recurso do Ministério Público de Mato Grosso, o caso deverá retornar ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso – que havia afastado a ocorrência dos danos morais coletivos – para análise de pedido subsidiário de redução do valor da indenização, fixada em R$ 10 mil em primeiro grau.
Extensão da área degradada, por si só, não afasta a ocorrência de dano extrapatrimonial
Relatora do recurso, a ministra Regina Helena Costa destacou que o artigo 225, parágrafo 4º, da Constituição Federal confere proteção jurídica especial à Floresta Amazônica, à Mata Atlântica, à Serra do Mar, ao Pantanal e à Zona Costeira, ao reconhecê-los como patrimônio nacional. Para a ministra, os danos ambientais nessas áreas configuram ilícito contra bem jurídico coletivo, exigindo reparação ampla, inclusive em sua dimensão imaterial.
A magistrada ressaltou que, além da responsabilização por danos materiais, o princípio da reparação integral impõe a recomposição completa do dano ecológico, o que inclui a indenização por danos morais difusos. A ministra apontou que esses danos são presumidos (in re ipsa) e independem de prova de sofrimento subjetivo, conforme estabelecido nos artigos 1º, inciso I, da Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública) e 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente).
“A constatação de danos imateriais ao meio ambiente não deflui, por si só, da atuação do agressor em descompasso com as regras protetivas do meio ambiente, reclamando, em verdade, a intolerabilidade da lesão à natureza e cuja ocorrência é presumida, cabendo ao réu afastar sua caracterização com base em critérios extraídos da legislação ambiental, diante da distribuição pro natura do ônus probatório, nos moldes da Súmula 618“, disse a ministra.
Ainda segundo Regina Helena Costa, não é possível afastar a ocorrência de danos extrapatrimoniais com base apenas na extensão da área degradada. A ministra defendeu uma análise que considere o efeito cumulativo de múltiplas ações degradantes, praticadas por diferentes agentes.
“A ilícita supressão de vegetação nativa situada na Floresta Amazônica contribui, de maneira inexorável, para a macrolesão ecológica à maior floresta tropical do planeta, cujos históricos índices de desmatamento põem em risco a integridade de ecossistema especialmente protegido pela ordem jurídica, razão pela qual todos aqueles que, direta ou indiretamente, praticam condutas deflagradoras de uma única, intolerável e injusta lesão ao bioma são corresponsáveis pelos danos ecológicos de cariz extrapatrimonial, modulando-se, no entanto, o quantum indenizatório na medida de suas respectivas culpabilidades”, concluiu.
Leia o acórdão no REsp 2.200.069.
Fonte: STJ